segunda-feira, 6 de abril de 2015

Exercício cardiovascular em jejum para perder massa gorda, sim ou não?

Será uma boa estratégia para perda de massa gorda o exercício cardiovascular em jejum??
 
Apesar de existirem várias opiniões acerca deste assunto,  é comum a prática de exercício cardiovascular em jejum entre os entusiastas do fitness, culturismo, ou até recomendado como estratégia eficaz para perda de massa gorda. Este mito está muito enraizado entre os praticantes e até alguns profissionais. A lógica é simples... uma vez que estivemos a usar ácidos gordos como substrato energético ao longo do jejum noturno, vamos ter mais gordura disponível durante o exercício se o fizermos antes de uma refeição, evitando assim o efeito da insulina e a transição para uma maior oxidação de hidratos de carbono. Apesar de ser um argumento válido e forte, a verdade é que a ciência não o parece corroborar.

É muito redutor pensar que o mais importante quando pretendemos perder massa gorda é a utilização de lípidos como substrato durante a sessão de treino. Se durar 45 min, temos mais 23 horas e 15 min no dia. O nosso metabolismo não pára neste período, e o balanço energético é de longe o factor determinante na perda de peso. Temos de ver o quadro completo e perguntar: “será que fazer cardio em jejum me vai fazer ficar mais magra?”. Totalmente diferente de dizer que o exercício cardiovascular em jejum “queima” mais gordura.

Sabe-se que o exercício físico de alta intensidade, apesar de depender mais dos hidratos de carbono durante a sessão, leva a uma maior utilização de ácidos gordos durante o período que se segue. Podemos chamar a este fenómeno o efeito “after burn”. Em intensidades crescentes, o fluxo sanguíneo é deslocado para o músculo e desviado do tecido adiposo. No entanto, existe lipólise gerada pela elevada produção de catecolaminas (adrenalina), libertando ácidos gordos que ficam retidos no tecido. Após o exercício, o desvio de sangue alivia e estes ácidos gordos são “disparados” até ao músculo onde são oxidados preferencialmente como fonte de energia. Quantificando, independentemente da intensidade e estado nutricional, o tecido adiposo liberta mais lípidos do que conseguimos gastar. Nas horas seguintes ao treino representam a maior fatia da energia gasta, sendo os hidratos de carbono poupados para a regeneração do glicogénio. Se o treino de alta intensidade é mais eficiente, dificilmente será mantido numa situação de jejum.

Mesmo que alguém, por algum motivo, consiga manter intensidades elevadas durante o treino em jejum, o efeito no dispêndio e partição energéticas não será mais favorável por isso. Na verdade, uma refeição antes do exercício pode aumentar o efeito térmico da sessão, evidenciado pelo maior consumo de oxigénio pós-treino, indicador de um dispêndio energético superior. Fazendo exercício em jejum, a utilização de hidratos de carbono como energia parece superior nas 12h e nas 24h seguintes, indicando que, mesmo assumindo uma maior utilização de lípidos durante a sessão, esta é inferior no resto do dia comparativamente a uma refeição pré-treino. Além disso, o inverso é verificado para o consumo de oxigénio, indiciando uma menor elevação da taxa metabólica no pós-exercício com jejum prévio.

Resumindo, teorias eloquentes nem sempre são suportadas pela evidência. O exercício em jejum não parece ser particularmente eficaz para perda de massa gorda, muito menos em atletas recreativos ou pessoas comuns. Não quero com isto dizer que não possa ser utilizado como estratégia pontual. É preferível certamente alguém treinar em jejum quando só tem essa hipótese do que não treinar de todo. No entanto, acreditar que esta estratégia vai conferir melhores resultados em termos de perda de massa gorda, e é este o ponto que estamos a abordar, não é suportado pela ciência nem pela nossa fisiologia.

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